Estas poucas Linhas...
Fernanda Figueiredo
Com o avanço das tecnologias, do computador, quase
não se escreve mais cartas. De fato, a maior parte da nossa comunicação é
realizada por e-mails.
Arrumando meu baú de lembranças, achei muitas
cartas trocadas com amigos, família e namorados. Como era gostosa a sensação de
esperar o carteiro, o que me faz lembrar esta canção: “Quando o carteiro chegou e
meu nome gritou com uma carta na mão...”
Essa sensação de se chegar em casa e encontrar em cima
da mesa, cartinhas em envelopes especiais, endereçadas com zelo e carinho, em envelopes
coloridos, reciclados, escritas em papel de seda, desenhadas com florzinhas,
com adornos é algo do passado.
Os conteúdos transpunham
sentimentos, delicadeza, as notícias que vinham de longe, dos parentes,
amigos e amores. Ou apenas, para entreter, outras densas, com informações factuais, ou cartas que mais ressoavam dilemas do
divã.
Alguns companheiros de aventuras, não sabiam o
meu sobrenome e endereçavam: "Fernanda Verde Manga"," Fernanda Companheira",
"Fernanda Verde Mata..."
Outras vinham com várias páginas (uma, duas,
três, quatro, cinco...) especialmente, as que versavam sobre conjuntura
política e ambientalismo, trocadas com amigo que morou um tempo em Paris. As
cartinhas vinham recheadas. Já a
à minha prima, que morava na Flórida, também, me
enviava folhas e mais folhas. Tânia nasceu com o dom da escrita, adorava receber
suas deliciosas cartinhas. Já minha irmã que morou na Romênia, me mandava
postais. Não tem como jogá-los fora. Postal é atemporal. Os monumentos continuam
iguais e as mensagens estão eternizadas.
Receber carta de namorado deixava a gente toda
prosa: Ah! Que bom que lembrou de mim...Ou ele estava com a consciência pesada,
arrumou outra e despachou um postal...Vai saber...
Também gostava de receber carta da minha amiga
Silvia, do tempo do Colégio Zoé Cerveira, na minha adolescência. À medida que releio vislumbro maturidade, busca existencial impressionante desta minha amiga. E das amigas
da Universidade: Débora, Gilda e Malena, adoravam escrever
algumas poucas linhas.
Recebi cartas de uma colega, do Colégio Batista, na qual
ela comentava: Lembra do dedão? Risos... Daí lembrei... Pegávamos carona na
volta para casa, algo transgressor naquela época, imagina, anos 70,
adolescentes apontando o dedão... Graças a Deus não tinha essa violência de
hoje. Um mundo ingênuo, de paz de amor.
Ao reler algumas, vi como o tempo mudou, certas cartas dão-nos uma ideia da evolução dos tempos, da tecnologia. E até as gírias
mudaram quem nunca escreveu um “Curtir as pampas”? Quem é desse tempo irá
lembrar...
As cartas são extensas, que
marcaram amizades sinceras, algumas perdidas na estrada, outras banidas pelo
tempo, algumas que já duram trinta anos... Sempre supus importantes, como se fossem as
cartas apaixonadas dos poetas, as cartas
históricas. Como gosto de trabalhar com memória, são importantes
instrumentos de trabalho, pesquisa.
Escrever é uma arte, mas detestava minha letra. Hoje, já gosto mais... Infelizmente, tem carta que seria melhor não ter escrito. Foi um caldeirão de ebulições, de cargas
sentimentais, que saem do âmago, extravasa à própria razão.
O e-mail é impessoal, com
o mundo cada vez mais vigiado, não há segurança nenhuma, não há como expor
tanta intimidade. Então, me bateu essa saudade das cartas, onde os sonhos
relatados tinham um sabor diferente, de construir cada palavra com emoção,
encantamento, sutilezas, segredos, medos, ressentimentos, incertezas...